segunda-feira, 5 de outubro de 2015

O DINHEIRO QUE CORROMPE: reflexões sobre o sistema político

Em entrevista, o cientista político José Antônio Moroni analisa as mudanças provocadas pelo fim do financiamento empresarial nas próximas eleições e diz esperar que a medida seja o começo de uma reestruturação na política brasileira, hoje comandada por “homens brancos, ricos, urbanos e heterossexuais”

Por Maíra Streit - fonte: Revista Forum
Esta é uma matéria da Fórum Semanal. Confira o conteúdo especial da edição 215 clicando aqui

Após o Supremo Tribunal Federal (STF) declarar inconstitucionais as doações de empresas para campanhas políticas, a presidenta Dilma Rousseff vetou, na última terça-feira (29), o inciso da chamada “Lei da Reforma Eleitoral”, aprovada pelo Congresso, que permitia esse tipo de financiamento.
Em sua justificativa, ela argumentou que ouviu o Ministério da Justiça e a Advocacia-Geral da União (AGU) sobre o assunto e que a contribuição de corporações no processo eleitoral “confrontaria a igualdade política”. Para analisar as mudanças trazidas por essas novas regras, Fórum conversou com José Antônio Moroni, cientista político e membro do colegiado de gestão do Instituto de Estudo Econômicos e Sociais (Inesc).
O especialista falou sobre os prejuízos causados à população com a interferência do poder econômico nas decisões de interesse público, avaliou o que será alterado nas estratégias de campanha para ganhar o eleitor e ressaltou ainda o perfil padronizado dos candidatos e a necessidade de garantir na disputa mais mulheres, negros e outros grupos historicamente excluídos.
Na opinião de Moroni, o fim das doações de pessoas jurídicas é um grande passo, mas exige também uma fiscalização aprofundada para assegurar transparência na prestação de contas dos partidos. Ele acrescentou que é preciso reestruturar o modo com que a política é tratada no Brasil para que possa, de fato, atender aos anseios populares e contribuir para a superação das desigualdades.
Confira a entrevista na íntegra.

Fórum – As campanhas eleitorais no Brasil estão entre as mais caras do mundo. E, em 2014, apenas dez empresas foram responsáveis pelo financiamento de 70% dos deputados federais eleitos. Quais os prejuízos desse modelo para o cidadão comum?
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“O financiamento empresarial de campanhas acaba com a soberania popular e distorce a vontade do eleitor” (Arte: GGN)

José Antonio Moroni - Vamos selecionar três prejuízos, mas tem muitos outros. O primeiro é que as empresas colocam nos seus custos essas “contribuições”, isso é, quando compramos um produto está embutido no preço desse produto todos os custos e lucros das empresas que interagiram na criação, fabricação, distribuição e venda. Se as contribuições estão embutidas nos custos no final, quem está pagando somos nós, que compramos esses produtos. O mesmo acontece com as obras públicas, que são pagas por nós através dos impostos.
O segundo é que muitos dos recursos que entram para financiar as campanhas entram no chamado ‘caixa dois’, pois são de origem ilegal, principalmente da sonegação e corrupção. Portanto, recursos que deviam ter pago impostos para financiar políticas públicas e não pagaram. Daí não tem recursos para saúde, para educação, para saneamento, para cultura, para lazer etc.
E o terceiro é que o financiamento empresarial das campanhas acaba com a soberania popular e distorce a vontade do/a eleitor/a. Pois na verdade quem decide os resultados das eleições, com raras exceções, é o poder econômico. As campanhas se tornaram grandes máquinas, grandes estruturas que mobilizam milhões, inviabilizando as campanhas feitas com poucos recursos.

Fórum – De que modo o fim do financiamento empresarial fará diferença nas próximas eleições, começando já em 2016?
Moroni - Primeiro, vai obrigar os partidos a repensarem as suas estratégias de campanhas, não mais pensadas como grandes estruturas de marketing e mais com propostas que possam atrair o/a eleitor/a. No médio prazo, vai obrigar os partidos a terem base social e política na sociedade, terminando com os partidos que só aparecem nas épocas das eleições.
Mas a sociedade tem que fazer a sua parte e a justiça eleitoral também, que é a fiscalização para que não se tenha o ‘caixa dois’ das campanhas e outros abusos, como por exemplo as chamadas personalidades que têm programas de TV e rádio, pastores etc.

Fórum – As campanhas deverão ficar mais baratas e, portanto, mais equilibradas. Na sua opinião, que estratégias serão utilizadas pelos candidatos para tentar se sobressair nessa disputa?
Moroni - Com certeza as campanhas vão ter que ficar mais baratas porque trancou a fonte do dinheiro fácil. Com isso, as candidaturas e os partidos vão ter que ter vida permanente e não apenas nas eleições. Vai vencer quem tiver contato permanente com a população, dialogando, construindo propostas e, depois de eleito, prestando contas.
São mudanças que vão ocorrer a médio e longo prazo, não são imediatas. Uma outra questão é referente aos partidos que são criados somente para captar dinheiro. Afinal, as eleições são grandes negócios com o financiamento empresarial. Eles não terão mais sentido de existir – para nós, nunca tiveram sentido -, mas os que foram criados com a lógica de lucrar não vão ter mais sentido.

Fórum – Existe uma carência de representatividade bastante séria de mulheres, negros, indígenas e outros grupos historicamente excluídos da política nacional. Essa realidade tende a mudar?
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“Quem decide os resultados das eleições, com raras exceções, é o poder econômico” (Foto: Pedro França/Agência Senado)

Moroni - Uma das questões que ocasionam essa sub-representação é a desigualdade no financiamento das campanhas. Afinal, as empresas não colocam recursos nas campanhas das mulheres pobres, na população negra, nos povos indígenas etc. Mas não é só isso. Mesmo acabando o financiamento empresarial, é necessário ter uma mudança da cultura política e da forma como a sociedade vê esses segmentos.
Vivemos numa sociedade machista, racista, homofóbica e, agora, se mostrando xenofóbica. Para mudar isso, além de mudar as regras eleitorais, precisamos mudar essa sociedade. Mas não podemos ficar esperando a sociedade mudar. Por isso, é necessário ter mecanismos que enfrentem essas sub-representações, que pode ser a paridade entre homens e mulheres, o parlamento indígena – onde os próprios povos indígenas escolhem a sua representação -, percentual de representantes da população negra igual [ao restante da] população etc.
O fato é que não podemos continuar a ter um poder no Brasil de homens, brancos, proprietários, ricos, urbanos, heterossexuais. A sociedade é mais complexa que isso. Vale ressaltar que esse perfil do poder não é apenas no Congresso, é também no Judiciário, no Executivo, em todas as instâncias de poder, sejam elas públicas, das empresas ou da própria sociedade.

Fórum – Além de proibir as doações de pessoas jurídicas, que outras medidas seriam necessárias para garantir lisura no processo eleitoral? Criminalização do ‘caixa dois’, por exemplo?

Moroni - Sim. A criminalização do ‘caixa dois’ é uma das medidas. Inclusive essa proposta consta na iniciativa popular pela reforma política democrática e eleições limpas. Precisamos criar instâncias com a participação paritária da sociedade, na justiça eleitoral para a fiscalização tanto do processo eleitoral como das prestações de contas.
Precisamos ter partidos e representantes com densidade social e, por isso, preocupados com a prestação de contas de seus atos na sociedade como um todo. Mas uma coisa é certa: o que acontece nos processos eleitorais não é muito diferente do que acontece em outras esferas. Em outras palavras, os mesmos vícios que acontecem nos espaços de poder acontecem em outros espaços da sociedade.
Precisamos nos colocar num movimento de refundar, recriar a nossa sociedade, baseada nos princípios da igualdade, da solidariedade, da não discriminação, do não preconceito. Portanto, uma sociedade radicalmente democrática, mas não criamos isso se não enfrentarmos todas as formas de desigualdades, sejam econômicas, raciais, de desejos sexuais, de deficiências, de idade, de local de onde você é. Só vamos conseguir isso com muita luta, discussões, formação e, com certeza, com muitos conflitos. Não vamos sair dessa sem conflitos.
Foto de capa: Agência UEL


http://www.revistaforum.com.br/blog/2015/10/o-dinheiro-que-corrompe/

A DIFERENÇA ENTRE SER PROFESSOR NA FINLÂNDIA E NO BRASIL . por Claudia Wallin

Neste exótico país onde a polícia não pratica tiro ao alvo com professores, a sistemática política de valorização do magistério produz resultados capazes de espantar até um pitbull da PM: a carreira de professor na Finlândia tornou-se uma das principais preferências entre os jovens, à frente de profissões como medicina, direito e arquitetura.

“O magistério na Finlândia é uma carreira de prestígio”, diz o professor Martti Mery na escola finlandesa Viikki, que também funciona como um centro de treinamento de professores vinculado à Universidade de Helsinque.

“A profissão possui um alto status em nossa sociedade, que tem grande respeito e consideração pelos professores”, ele acrescenta.
A invejável cultura finlandesa de dignidade profissional dos docentes e respeito ao professor foi forjada na revolução educacional conduzida pela Finlândia a partir dos anos 70, que alçou o país para as posições mais elevadas do ranking mundial de desempenho escolar. 

A transformação que se produziu incluiu um fator de relevância especial: o nível de excelência dos professores. Todos os programas de formação de professores, que anteriormente eram realizados fora do âmbito do ensino acadêmico superior, foram levados para dentro das universidades, todas elas gratuitas. Mais: obter um mestrado tornou-se a qualificação básica e obrigatória de um professor para poder ensinar nas escolas finlandesas – mesmo na educação pré-escolar.

“No fim dos anos 70, a formação dos professores finlandeses passou a constituir um programa de mestrado com cinco anos de duração, que se dá portanto nas universidades do país. Desde então, gradualmente cresceu entre os professores o sentimento de pertencer a uma categoria profissional altamente educada e prestigiada”, diz o educador finlandês Pasi Sahlberg, um dos arquitetos do chamado milagre finlandês. 

A exigência do grau de mestre para os docentes foi uma medida significativa da reforma educacional, observa Sahlberg:
“Isso não só elevou toda a categoria dos professores como profissionais, como passou a dar a eles um profundo conhecimento sobre os mais recentes avanços da pesquisa em suas respectivas áreas de ensino”, ele diz. 

Outro aspecto crítico para o sucesso do modelo finlandês foi o desenvolvimento de uma relação de respeito com o professor, e de boas condições de trabalho nas escolas. Como, por exemplo, uma divisão equilibrada do tempo em que um professor necessita trabalhar dentro e fora da sala de aula.
É esta, dizem os finlandeses, a melhor forma de atrair profissionais jovens e talentosos para a carreira de professor nas escolas públicas.
“A experiência finlandesa mostra que o principal é garantir que os professores sejam tratados com dignidade, a fim de que possam concretizar o objetivo de escolher o magistério como a carreira de uma vida inteira”, enfatiza Pasi Sahlberg.
Foto.Finlandia.Professora.computersCursos de doutorado para professores também são disponibilizados, gratuitamente, nas universidades do país. O Estado finlandês investe ainda cerca de USD 30 milhões a cada ano para o desenvolvimento profissional de professores e diretores de escola, através de cursos universitários e programas de reciclagem.
Foi assim, e não tratando professores como bandidos, que os finlandeses criaram uma legião permanente e aplicada de candidatos ao magistério no país.

A carreira de professor tornou-se uma das mais competitivas do país.

A mídia finlandesa divulga regularmente resultados de pesquisas sobre as preferências dos estudantes do ensino secundário, que sistematicamente apontam o magistério entre as profissões mais desejadas.
A cada primavera, milhares de jovens se candidatam a uma vaga para estudar nos departamentos de formação de professores das universidades da Finlândia.

Mas apenas os melhores e mais preparados estudantes podem se tornar professores na Finlândia: no exigente sistema finlandês, apenas cerca de 10% dos candidatos são em geral aprovados para cursar o obrigatório mestrado na universidade.

“A carreira de professor é extremamente popular aqui na Finlândia. Mas os exames de admissão são competitivos a tal ponto, que chegam a intimidar os candidatos. Por isso, nem todos os estudantes que desejam seguir o magistério chegam a se candidatar, por medo da reprovação”, diz Niklas Nikanorov, do Ministério da Educação e Cultura finlandês. 

Em 2014, diz Nikanorov, apenas 8,9% dos 7.469 candidatos ao curso de formação de professores da Universidade de Helsinque foram aprovados. No mesmo ano, 1.597 estudantes candidataram-se ao curso de medicina da instituição, e 11,7% foram aceitos.
Sim, é isso mesmo: na Finlândia, o magistério é mais popular que a medicina.

“Do total de 139 mil estudantes universitários em todo o país, mais de 10% estudam ciências educacionais”, acrescenta Niklas Nikanorov.

Para realizar o sonho de se tornar um professor, um jovem finlandês deve ser dono de um robusto currículo escolar – além de obter excelentes notas na prova nacional de conclusão do ensino secundário, e também no exame prestado especificamente para a candidatura ao curso universitário, com perguntas focadas em um amplo conjunto de tópicos educacionais. 

Na segunda fase de seleção para o acesso à universidade, os candidatos mais bem colocados da etapa inicial passam por uma série de entrevistas para explicar, por exemplo, porque decidiram se tornar professores. No final, só entram os best and brightest.
Conquistado o diploma, o professor vai receber um bom salário – mas que se situa dentro da média salarial do país como um todo (3,284 euros, segundo a agência nacional de estatísticas da Finlândia). E na igualitária sociedade finlandesa, assim como na Escandinávia em geral, as diferenças entre os salários não costumam ser exorbitantes. 

O salário médio de um professor primário finlandês é de 3,132 euros mensais (cerca de 11,8 mil reais). Professores do ensino médio recebem 3,832 euros, e docentes de universidades ganham em média 4,169 euros por mês (15,7 mil reais).

Vamos comparar: um “käräjäoikeustuomari” (juiz de primeira instância) na Finlândia recebe em média 5,797 euros mensais (cerca de 22 mil reais). Um engenheiro ganha 4,577 euros. Um médico, 7,296 euros. Uma enfermeira, 3,488 euros. O diretor-executivo de uma empresa, 6,755 euros em média.

Um deputado federal brasileiro entraria talvez em estado comatoso ao descobrir o valor do salário de um parlamentar finlandês: 6,355 euros mensais (aproximadamente 24 mil reais) – mas sem direito a verbas indenizatórias ou penduricalhos extras. Isso para viver em um país caro que possui uma das mais elevadas cargas tributárias do mundo, onde o cidadão paga cerca de 51,5% de impostos sobre sua renda.

No Brasil, além do salário de R$ 33,7 mil, um parlamentar recebe ainda o chamado cotão (média de R$ 33.010,31), verba de gabinete para até 25 funcionários (R$ 78 mil) e variados benefícios extras, como ajuda de custo, auxílio-moradia e plano de saúde cinco estrelas. Os privilégios se multiplicam ainda mais na esfera da Justiça, em que o dinheiro dos impostos do cidadão chega a bancar uma obscena Bolsa Educação para pagar escolas particulares para filhos de juízes do Rio de Janeiro.

Enquanto isso, os professores brasileiros estão entre os educadores mais mal pagos do mundo – segundo apontou em 2014 o ranking internacional divulgado pela OCDE a partir de dados dos 34 países membros da organização e dez parceiros, incluindo o Brasil.
O valor do piso salarial dos professores brasileiros: R$ 1.917,78. Para professores da rede pública com diploma de licenciatura no início da carreira, o salário-base médio é de R$ 2.711,48 (excluindo gratificações).

No resto do mundo, países como a Suíça, a Holanda e a Alemanha pagam salários mais altos aos professores do que a Finlândia, apesar de registrarem índices mais baixos de desempenho escolar. No estudo da OECD, a Finlândia aparece em nono lugar na lista dos países que melhor pagam seus professores.
Qual seria então a principal motivação de uma pessoa para se tornar um professor na Finlândia?

“Respeito”, responde o professor Martti Mery, da escola Viikki.
Tal é a confiança nos mestres, que não existe nenhum tipo de avaliação formal do desempenho de professores na Finlândia. O sistema nacional de inspeção escolar, que antes exercia esta função, foi abolido no início dos anos 90. 

“Controlar o desempenho do professor não é uma questão relevante na Finlândia. A premissa básica é de que os professores são, por definição, profissionais altamente educados que realizam o melhor trabalho possível nas escolas”, diz o educador finlandês Pasi Sahlberg.

Entregar a liderança do sistema a profissionais da educação também é parte da fórmula do milagre finlandês, observa Pasi Sahlberg:
“Discordamos da visão de que a melhor forma de desenvolver a educação é colocar o controle das escolas nas mãos de administradores sem experiência no setor, na esperança de que um gerenciamento de estilo empresarial vá elevar a eficiência. Na Finlândia, todas as autoridades do setor de educação estão, sem exceção, nas mãos de educadores profissionais”, ele destaca.
A taxa de sindicalização da categoria é uma das mais altas do mundo: 95% dos professores finlandeses são filiados ao poderoso Opetusalan Ammattijärjestö (OAJ), chamado de “A Voz dos Professores”.

“O modelo finlandês mostra que a colaboração com sindicatos de professores, e não o conflito, produz melhores resultados. As evidências são claras, e é este o caminho a seguir”, diz Pasi Sahlberg, que hoje atua como professor visitante da Universidade de Harvard.
* Texto publicado originalmente no Diário do Centro do Mund

http://www.claudiawallin.com.br/2015/10/03/a-diferenca-entre-ser-professor-na-finlandia-e-no-brasil/

Infância dopada: crianças agitadas estão sendo rotuladas como doentes mentais

 É impressionante como são produzidas "soluções" imediatistas para questões tão complexas como a educação. Crianças estão sendo cada vez mais dopadas para se enquadrar em um comportamento pretensamente normal, robótico e obediente. Quando na verdade, frequentemente, não se enxerga a criança por trás do comportamento. Esses são sintomas da "liquidez do nosso tempo", como diria Bauman.

 

 Ritalina, uma perigosa "facilidade" para os pais

Especialista condena o uso do remédio sem antes considerar as necessidades da criança; Brasil é o 2º maior consumidor mundial


A busca por soluções fáceis, o diagnóstico equivocado e a incompreensão dos pais acerca da agitação natural das crianças elevou o Brasil ao posto de segundo maior consumidor de Ritalina do mundo, perdendo apenas para os Estados Unidos.
O dado, do Instituto Brasileiro de Defesa dos Usuários de Medicamentos, é alarmante. Ritalina é o nome comercial do metilfenidato, medicação que promete tratar o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, ou TDAH, e os principais consumidores da droga tarja preta são crianças e adolescentes.
Segundo a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), de 8% a 12% das crianças no mundo foram diagnosticadas com TDAH, e a suspeita dos pais de que os filhos tenham o transtorno é o principal motivo que os leva aos médicos. Em 2010 foram vendidas 2,1 milhões de caixas de metilfenidato. Em 2013, foram 2,6 milhões.
Para conversar sobre o uso indiscriminado de Ritalina e sua consequências, CartaCapital entrevistou Wagner Ranña, médico psiquiatra com experiência em saúde mental da infância e docente do Sedes Sapietiae, um instituto dedicado à saúde mental, à educação e à filosofia.

CartaCapital: O Brasil é o segundo maior consumidor de Ritalina do mundo. A que se deve isso?

Wagner Ranña: No Brasil, a rede voltada para assistência aos problemas de saúde mental da criança e do adolescente é muito precária -- o que não é privilégio do Brasil, este problema afeta a quase todos os países. As crianças com dificuldades de comportamento, agitadas e irrequietas são vistas como doentes pelos profissionais da psiquiatria biológica e da neurociência, e então eles receitam remédios. Como consequência, temos um número elevadíssimo de crianças recebendo medicação, mas sem se discutir se a ela é mesmo necessária ou se é a melhor forma de cuidado.
Na visão do nosso grupo de trabalho no Sedes Sapientiae, que tem um histórico no cuidado com a saúde mental da criança, é de tentar entender o sofrimento psíquico e os problemas de comportamento. E não ver isso de pronto como um problema, porque a maioria são só crianças agitadas. E, no mundo da rapidez, ironicamente, elas são colocadas como doentes. Estamos desperdiçando jovens que poderiam ser sujeitos muito ágeis, como atletas e músicos.

CC: Há efeitos colaterais no uso do remédio?
WR: Além de causar dependência, a Ritalina provoca muitos outros efeitos colaterais: as crianças emagrecem, têm insônia, podem ter dor de cabeça e enurese [incontinência urinária]. E, apesar de sua fama, não tenho uma experiência de eficácia da droga, mesmo em casos em que ela deveria ser usada. Percebo que o trabalho de terapia, de orientação e cuidado real com a criança dá muito mais resultado.
Começamos a passar para a criança a cultura de que um comprimido resolve tudo na vida, de que não existe mais solução pelo pensamento, pela conversa, pelo afeto e pela compreensão. O mundo todo é agitado, as pessoas são desatenciosas umas com as outras, e as crianças é que acabam tachadas de hiperativas.
Outra coisa, as crianças falam assim para mim: “eu sou um TDAH” ou “eu sou o da Ritalina”. Elas se colocam nesse lugar de alguém doente, com um déficit. A vida deles vira isso.
Tratar com drogas as crianças agitadas ou com dificuldade de aprendizagem é deixar de questionar o método de ensino, o consenso da escola, e a subjetividade da criança diante do aprendizado. É uma atitude muito imediatista.
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Estamos desperdiçando jovens que poderiam ser sujeitos muito ágeis, como atletas e músicos / Crédito: Daniel Caron/FAS
CC: E quais são as alternativas ao tratamento com a droga?
WR: Tenho visto muitas crianças que, por trás da agitação, estão submetidas a uma violência, um abuso, ou a uma situação psicopedagógica não adequada. Colocar tudo como sendo um problema do cérebro da criança é muito antiético, é não levar em conta sofrimentos e as necessidades que ela está expressando.
Por exemplo, outro dia atendi uma menina que a mãe dizia ser hiperativa e precisava de Ritalina. Em cinco minutos de conversa descobri que ela tinha vivido uma situação em que o pai tentou matar a mãe. Essa criança estava angustiada, não era hiperatividade.
É claro que cada caso é um caso, há crianças realmente hiperativas e que precisam de um cuidado. Ainda assim têm muitas medicadas de maneira incorreta. E estamos vivendo uma epidemia de transtornos, ou supostos transtornos. Então além dessa medicalização excessiva, há uma falta de projetos terapêuticos para o sofrimento psíquico na infância, que é grande. Isso facilita a medicalização da infância, pois sem equipes treinadas é mais fácil só dar o remédio.
CC: Há quem exagere ou finja sintomas para conseguir a receita?
WR: Sou totalmente contrário o uso de questionários com pontos para o diagnóstico de sofrimento psíquicos [como fazem muitos psiquiatras]. Isso não é ver a criança eticamente. E os adolescentes podem fingir mesmo, porque querem tomar Ritalina para ter um bom desempenho na prova, ter mais energia para estudar.
A Ritalina é uma anfetamina associada a drogas com ação na atividade cerebral. A cocaína e as anfetaminas são consumidas por atletas que querem mais rapidez, pelos executivos que querem ficar acordados para trabalhar mais, pelos motoristas que querem fazer uma viagem e não dormir. É um verdadeiro doping.

http://www.cartacapital.com.br/sociedade/ritalina-uma-perigosa-facilidade-para-pais-8006.html

Como o financiamento empresarial corrompe o serviço público ?

Reforma ministerial acende o alerta vermelho no SUS



O novo ministro da Saúde, Marcelo Castro (PMDB-PI), que assumiu o cargo em substituição a Arthur Chioro, nunca foi um defensor da saúde pública e, pelo seu histórico pessoal e de seu partido, pode trazer retrocessos ao setor.

No Legislativo o deputado foi favorável a medidas como a emenda constitucional que tratou do chamado Orçamento Impositivo e afetou negativamente o financiamento da saúde ao diminuir a contribuição da União ao SUS. A mesma emenda (86/2015) prevê ainda o repasse de parte do valor para as emendas parlamentares individuais, com menor fiscalização ou controle de seus direcionamentos.
O atual ministro é companheiro de legenda e próximo politicamente do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), um dos maiores defensores da PEC 182/2007, que regulamenta o financiamento empresarial de campanha e foi aprovada na Câmara por meio de manobras da mesa. A PEC, porém, foi vetada pela presidenta Dilma Rousseff após o Supremo Tribunal Federal ter declarado inconstitucional essa modalidade de doação.

Cunha vem agora atuando para a derrubada do veto presidencial para garantir a doação de empresas. O presidente da Câmara e padrinho político de Castro já demonstrou ser um forte representante dos empresários da saúde em outras ocasiões. Foi relator da Medida Provisória 627/2013, que visava anistiar a dívida dos planos com o SUS em R$ 2 bilhões. Foi ainda autor da PEC 451/2014, que tenta tornar os planos de saúde um direito trabalhista, aumentando assim o faturamento anual das operadoras.
O peemedebista vetou ainda a instalação da CPI dos planos de saúde e, segundo dados do TSE, recebeu R$ 250 mil da Bradesco Saúde para a sua campanha eleitoral. Já o PMDB enquanto partido foi beneficiário de R$ 13,7 milhões dos planos.

Cabe ressaltar que no apagar das luzes, próximo ao último recesso de final de ano, em 17 de dezembro de 2014, foi votado no Congresso a permissão de entrada de capital estrangeiro na assistência à saúde. O autor foi outro parlamentar peemedebista, o deputado federal Manoel Junior (PMDB/PB), que disputava com Castro a indicação para ser o novo ministro.

Ataques ao SUS também no Senado

No início de agosto o presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL) apresentou aos ministros da área econômica a chamada Agenda Brasil, com 27 propostas para tentar superar a crise econômica. Uma das propostas foi a cobrança diferenciada de procedimentos do SUS por faixa de renda, na contramão ao conceito de um sistema de saúde universal e gratuito.
Após a pressão dos movimentos sociais, esta ideia perdeu força, porém outras medidas se mantêm, como a proibição de liminares judiciais que obrigam a aceitação por parte dos planos de tratamentos com procedimentos experimentais ou não homologados pelo SUS. Novamente trata-se de uma ação para favorecer os cofres da iniciativa privada.

Com a ineficiência do Estado atrelada aos interesses dos empresários em aumentar a crise do sistema de saúde pública, o poder judiciário vem ganhando força em alguns embates. Segundo a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), entre março e junho deste ano foram mais de 21 mil reclamações. Entre as queixas que chegam à justiça, cerca de 90% terminam com ganho de causa a favor do consumidor, por conta de descumprimento de cláusulas contratuais por parte das operadoras.
Reforçando este quadro, órgãos de defesa do consumidor como o PROCON e o IDEC denunciam a permanência dos planos de saúde entre os primeiros no topo do ranking de reclamações na última década.

Segundo o TSE, nas últimas eleições os planos de saúde doaram cerca de R$ 52 milhões para a candidatura de 131 parlamentares. A agência que regula e fiscaliza os planos de saúde, a ANS, por sua vez, tem representantes dos empresários da saúde em sua diretoria. Em junho deste ano, com o apoio de Eduardo Cunha, a presidência foi assumida por José Carlos de Souza Abrahão, que comandou a CNS (Confederação Nacional de Saúde, Hospitais, Estabelecimentos e Serviços), entidade sindical que representa as operadoras.
A intenção deste conjunto de ações do mercado e sua bancada parlamentar é inverter a lógica do atendimento de saúde público e universal, colocando o SUS em um papel de complementar da saúde privada. A nomeação de Castro para o ministério da Saúde é mais um passo firme nesta direção.

* Leandro Farias é farmacêutico sanitarista e especialista em direito e saúde pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e Coordenador do Movimento Chega de Descaso.






http://www.cartacapital.com.br/sociedade/ritalina-uma-perigosa-facilidade-para-pais-8006.html

quarta-feira, 15 de abril de 2015

Dep. Edilson Silva combate a perseguição aos gevistas


A portaria de nº 28/2015 contém um surto de autoritarismo, e para nós, profissionais que estão em greve, denota um rompante de fúria de quem não tem recurso para o diálogo pois sabe estar sendo arbitrário.

Eduardo, quebrava os movimentos com outros instrumentos, para não apelar para força bruta. O fez quando acho preciso. Mas, o Gov. Paulo Câmara não foi indicado para a função de governador pau mandado, e sendo assim, não tem condições de reverter, sequer tratar do problema fiscal do estado objetivamente. Ou seja, ele não tem poder sequer para falar que herdou um estado endividado, que tem um rombo nas contas públicas e que por isso, foram feitos pesados cortes no lado mais fraco, os servidores públicos. 

Sabemos que os recursos do FUNDEB estão vindo reajustados desde janeiro, então, o que justifica o aumento 0%. Nada. Ou melhor, nada que o governador possa falar em público. Há justificativa, mas, não deve ser legal. Portanto, silêncio sobre o assunto, e pancada nos dissidentes. 




Parlamentar anuncia ação judicial contra Governo do Estado*


“O governador Paulo Câmara sofre de uma carência de assessoria jurídica, ou então tem no seu DNA o autoritarismo e a falta de respeito com o estado democrático de direito”



A greve dos professores da rede estadual de ensino voltou a ser assunto da Reunião Plenária da Assembleia na tarde de ontem. O deputado Edilson Silva (PSOL) anunciou que seu partido ingressou com mandado de segurança contra o Governo do Estado em resposta à Portaria nº 28/2015, publicada ontem no Diário Oficial, que determina desconto das faltas, alteração da data de pagamento, rescisão dos contratos temporários e remoção das escolas de referência daqueles servidores que aderirem à paralisação. 

De acordo com o parlamentar, esse é o segundo mandado de segurança do partido contra o Governo do Estado, em menos de 45 dias. O primeiro dizia respeito à inobservância do piso da categoria. “A ação questiona o abuso de autoridade do Governo”, explicou. “O governador Paulo Câmara sofre de uma carência de assessoria jurídica, ou então tem no seu DNA o autoritarismo e a falta de respeito com o estado democrático de direito”, frisou. 

Silva lembrou que o direito de greve está consagrado na legislação brasileira, citando trechos da Lei nº 7783/89, que dispõe sobre a matéria. “Essa paralisação começou agora e não foi decretada ilegal pela Justiça. O governador não pode ir para a imprensa ameaçar, constranger e interferir na liberdade de organização sindical, que foi conquistada durante décadas de luta pelo nosso povo”, pontuou. Ele informou ainda que o partido vai orientar os professores do Estado a ingressarem com ações judiciais por perdas e danos morais. 

O deputado também lembrou que quase 42% dos profissionais que estão em sala de aula são temporários, e citou um edital de seleção lançado recentemente para a contratação de outros 600 professores sem concurso público. “A questão salarial é a ponta do iceberg, mas a forma como este Governo de continuidade vem tratando a educação nos tira da esfera da política. É um caso de justiça, por isso temos que usar desse expediente”, reiterou. 

Em aparte, o líder da Oposição, deputado Sílvio Costa Filho (PTB), alegou que a questão passa pela falta de planejamento na escolha das prioridades do Governo do Estado. “Vemos gastos elevados com a Arena da Copa, materiais de consumo e publicidade, mas ainda não foi implementado o piso salarial, que é lei e deve ser cumprido”, observou. 

Presidente da Comissão de Educação e Cultura da Alepe, a deputada Teresa Leitão (PT) disse que o tema está na pauta do colegiado, motivado por ofício do sindicato da categoria. “Não pagar no dia do calendário é sequestro de salário, e esse decreto autoritário lembra o modo como a greve era tratada na Ditadura Militar”, criticou. 

Para a deputada Priscila Krause (DEM), a Casa “não pode perder de vista o reajuste anual e uma progressão de reajustes para o cumprimento da promessa de campanha do governador, que foi dobrar o salário dos professores”. O vice-líder do Governo, Tony Gel (PMDB), lembrou que o País vive um momento de retração, o que demanda cuidado com os gastos. “Acredito que a greve é prematura, ao ser deflagrada em uma gestão com pouco mais de cem dias”, avaliou. 

*Fonte. Assembleia Legislativa. http://www.alepe.pe.gov.br/paginas/vernoticia.php?doc=AA65395CBB08E0DA03257E27008169F2

segunda-feira, 6 de abril de 2015

VAI TER GREVE! MAS QUE GREVE?

A MAIOR DE TODAS AS GREVES


Estamos vivendo um período singular para os trabalhadores em educação de Pernambuco. Um fim de ciclo, a exaustão de um modelo de política educacional que foi um dos principais vetores de um projeto de poder para o estado e com aspirações nacionais.

Alguns já discordarão das primeiras linhas. Fim de ciclo? Calma, eu explico. Não vou rodear muito, este é apenas um texto preliminar, pois o assunto é demasiado complexo e polêmico.

Tratarei da política educacional nos governos do PSB em Pernambuco, portanto de 2007 até hoje e as perspectivas para a mobilização docente em curso. Considero que estamos em um fim de ciclo, pois, o que foi sendo implementado com tranquilidade pelo governo desde 2007 começa a dar claros sinais de exaustão. Os pontos seguintes esboçam alguns elementos que, para mim, justificam o que considero ser um fim de ciclo:

1.     Estagnação dos índices: O crescimento mais fácil dos índices, baseados no fluxo, está se esgotando (ou já esgotou para maioria das escolas). De modo que, sem um crescimento robusto nos resultados de proficiência (SAEPE/SAEB), os índices da rede inevitavelmente estacionarão ou declinarão. As estratégias de “produção” de resultados, no cenário adverso, contarão com menos participação, fazendo com que a parte “anabolizada” do indicador se aproxime de um patamar mais próximo da realidade. Ainda ocorrerá a chegada ao 3º ano dos alunos que foram “municipalizados”, e que provavelmente, voltarão no mínimo, menos adestráveis do que se tivessem continuado da rede.

2.     Desmoralização (ou fim) do BDE: O grande elemento motivador da “produção” de resultados no chão da escola, o BDE, já está desmoralizado com o que houve em 2014. As escolas que foram de 0 a 100% depois de protestos. E mesmo assim, é muito provável que em 2015 a política de bônus seja suspensa devido ao empobrecimento repentino do ente federado (que era rico na campanha eleitoral, e começa o mandato quebrado). Assim o governo perde o seu principal instrumento de “adestramento” da classe. O estímulo positivo (segundo Skinner) irá para o espaço, só ficarão os negativos, ainda mais aditivados pelo descontentamento crescente.


3.     Crise fiscal do Governo: Estramos em um período difícil, de vacas magras. A grande parte da categoria é despolitizada, e facilmente se acomoda com algumas concessões e se adequa as inconveniências (SIEPE, monitoramentos, pressões, golpe no PCC etc) contanto que tenha uma expectativa de benefícios contínuos e crescentes.
Eduardo conseguiu manter essa expectativa, não para mim, mas para muitos. Por isso, sempre tem quem diga com gratidão pessoal que ganhou curso, computador, aumento, bônus, foi para formação em hotéis, está numa escola de referência... como se tudo isso fosse pura benevolência do governo. Enfim, enquanto haviam novidades que ao menos contrabalançavam o cenário de depredação do nosso PCC ,por exemplo, a maioria chegava a um contentamento. Ou mesmo descontente, não ficava ao ponto de se engajar em qualquer movimento. Agora está sendo diferente.

O cenário é adverso, as promessas já transparecem como estelionato eleitoral e a margem de benefícios que levava a uma acomodação não existe mais. Grande exemplo disso está sendo a mobilização maciça das escolas de referência. O que antes era posto como um posição distinta, e por isso quem criticasse poderia cair fora, apresenta um cenário de estagnação de investimento. Há pressões, cobranças, lacunas diversas, que foram toleradas, abafadas, por essa distinção temporária. Mas, agora, sem perspectivas, os docentes chutaram o balde e quebraram o argumento do chicote. Como trocar toda equipe, se a escola parou 100%? Onde vão achar tantos profissionais efetivos querendo ir para a referência? e as escolas que estão sendo fechadas, os profissionais jogados para outras escolas farão o trabalhinho conforme a cartilha do governo?

Para os próprios estudantes fica evidente a distância entre a propaganda e a realidade das escolas. O que se tornará mais evidente em um ano de crise. O tensionamento será inevitável, e a busca por alternativas de resistência fora do sindicalismo complacente praticado pelo SINTEPE também. Este mesmo, terá que ao menos encenar a luta para não cair no completo descrédito e perder mais espaço para as desfiliações ou para a concorrência, o cavalo de Tróia da OPP.(Quando alguém ver a OPP falar contra o governo me avisem!)


4.     O chicote está perdendo o efeito ? A política do chicote e da chantagem, já mostra seus sinais de exaustão pela paralisação de dois dias que contou com a participação sólida da categoria, com destaque para a “insurreição” das EREMs, e especialmente dos estudantes.  Ou seja, independente das amarras dos dirigentes sindicais, a categoria tem demonstrado que a corda esticou. Até escolas “vitrine” do governo como o Porto Digital pararam 100%, é sinal dos tempos.  As promessas ufanistas da campanha e o contraste com o deboche do aumento 0% e o golpe no PCC foram o fim da picada. E a categoria está se articulando com elementos inovadores que devem potencializar a luta sindical e impor uma nova correlação de forças com o governo. As pressões por prazos, tirar pendências, os registros duplos ou triplos (caderneta, siepe e monitoramento)as ameaças de advertência, notificação, cortar ponto serão cada vez menos eficientes, quiçá inúteis (tomara).


5.     Governo mais frágil: O governo Câmara, provavelmente não terá, nem de longe, a solidez política que o Eduardo conseguiu obter.(Entenda-se aqui solidez como blindagem, como hegemonia) Ou seja, ignorar solenemente os protestos dos servidores públicos ficará cada vez mais difícil, pois há um legado político-eleitoral a ser defendido por eles. Mas os instrumentos de controle habituais, inclusive midiático, não estão se mostrando afinados como nos últimos 8 anos. A própria definição mais clara de oposição e situação na ALEPE, delimita um espaço, que de fato o governo tem ampla maioria, mas a minoria tem condições de fazer barulho e mobilizar a indignação de diversos setores nesse momento crítico. Ou seja, o silêncio ensurdecedor dos governos Campos, não deve existir no governo atual.

É SUFICIENTE PARA ROMPER O PACTO DA MEDIOCRIDADE ?

Existem outros elementos, mas, em suma, pode-se afirmar que a corda esticou para o governo e para os servidores. O pacto de mediocridade acontece mediante a busca desvairada e inconsequente dos professores por uma bonificação e o estímulo velado do governo para que assim ocorra a produção os números para a vitrine política. Tudo isso a despeito do que isso representaria para os alunos por exemplo, e para os próprios profissionais. A manutenção de pacto tácito, não será facilmente replicada nessas condições. E sendo assim, o governo perde um lastro da sua política. É melhor chantagear e pressionar para talvez pagar um prêmio, do que dialogar e melhorar de fato as condições de trabalho. É uma razão contábil, produzir muito, gastando o mínimo possível. Quem paga bônus, não quer investir em salário. Mas, sem bônus e sem melhoria salarial, como é que fica?

Quando o governo que prometeu na campanha dobrar os salários dos servidores das regulares e criar um cargo com vencimento de 4.000 para os EREMs, e logo no início do governo anuncia aumento 0%, cria-se um cenário de conflito iminente e inevitável. Diga-se de passagem, mesmo que o governo cumpra a lei do piso, ainda vai ficar devendo em relação ao que prometeu em campanha. Mas como vai se dar esse conflito?

VAI TER GREVE! MAS QUE GREVE?

As estratégias e instrumentos utilizados pela categoria nesse conflito é a grande questão que está na pauta da categoria. Greve, ou paralisação; greve de fato,  branca ou de pijama. Por quanto tempo? indeterminado, até conseguir qualquer coisa, volta para o batente de cabeça baixa... enfim, como se dará a reação dos docentes em relação ao governo.

Na próxima assembleia (10/04) vamos decidir provavelmente com parâmetros antigos, para uma situação bem distinta. Digo mais, provavelmente, as decisões da assembleia não tragam nenhuma inovação porque nenhuma das forças mais representativas está contemplando seriamente novas trincheiras da luta política e sindical. De um lado, a diretoria com freio de mão puxado, a tal "trava política", seja das vinculações partidárias, ou pelo medo de perder a consignação e as vantagens que foram obtidas, justamente por concessões, para a estrutura sindical.  A direção não deverá radicalizar, vai tentar promover eventos mais simbólicos, para dar mídia e com isso sensibilizar o governo. A oposição já discute alternativas mas, em sua maioria, quer a greve já, para o que der e vier. Há nuances entre as duas vertentes, mas, de certo modo é o debate que vem ocorrendo. (obviamente essa é a minha percepção, posso estar completamente equivocado)

Assim posto, teremos duas opções prevalecentes, que muito provavelmente não resultarão em nenhuma conquista, se o governo estiver realmente obstinado em manter a sua posição, com base em planilhas contábeis e no retrospecto político das últimas greves e eleições. Em suma, o governo tem sérios motivos para acreditar que nossa categoria não gera prejuízo político para o governo. O mesmo, que adotando algumas medidas (mesmo arbitrárias) como o desconto sem reposição, tem sido suficiente para derrotar os professores. Além disso, ninguém deixou de se eleger porque destruiu nosso PCC em 2008. Pelo contrário, o governo tem um retrospecto eleitoral extraordinário, e os deputados “inimigos da educação” da última safra não sofreram prejuízos evidentes por terem aprovado projetos nocivos à categoria.

Portanto, não temos plano b. Diante desse cenário, eu tenho cultivado uma hipótese que escapa ao debate imediatista, que que vou apresentar brevemente como desfecho desse texto e abertura para discussões posteriores.

A MAIOR DE TODAS AS GREVES SE DÁ PELA NÃO COOPERAÇÃO SISTEMÁTICA AO MODELO DE “GESTÃO POR RESULTADOS”, E PELO COMBATE POLÍTICO DE SUA PROPAGANDA.

                Como disse na última assembleia, a luta sindical deve ampliar seus campos de atuação, especialmente, contemplando estratégias de resistência no chão da escola, e de confrontação política nas redes sociais. Sem isso, ir para as ruas, por maior que seja o movimento, pode não ser o suficiente para atingir a racionalidade político-eleitoral em que se assenta a perspectiva dos governos. Ou seja, qual a possibilidade de desgaste real para um governo de uma greve convencional ? tem sido muito pequena, ou mesmo nula.

O nosso grande trunfo como categoria de massa é a mobilização das comunidades com que trabalhamos diretamente, o que requer uma atuação como formadores de opinião (não adestradores de consciências). Algo que passa ao largo das discussões, quase sempre imediatistas, que soam para a comunidade como uma cantiga repetida, “os professores querem dinheiro”. É uma ‘cantiga’ justa, mas, que não agrega. Reverter um movimento com esse lastro convencional, é muito fácil para o poder de mídia que tem o governo.

            Mas, se a pauta for ampla, e se incorporar questões que envolvem diretamente os alunos, a comunidade, que interessem a população em geral, fica mais difícil combater. Como o governo pode dizer que os professores que fustigam os alunos, se esses mesmos estão indo para a rua com cartazes “Paulo a culpa é sua!” ?

E o principal, NÃO ADIANTA IR GRITAR NAS RUAS CONTRA O GOVERNO, XINGÁ-LO NA INTERNET, E FAZER O JOGO DELE COMO CORDEIRINHOS NO CHÃO DA ESCOLA!

Que jogo é esse? Todos sabem. O vale tudo pelo bônus, a aprovação em massa, o adestramento para os exames externos, as chantagens envolvendo notas e etc. Além dos subterfúgios que configuram clara ilicitude. 

A MAIOR DE TODAS AS GREVES É INEVITÁVEL, ININTERRUPTA, INIMPUTÁVEL[1]
A não-cooperação, ou mesmo o boicote, não podem ser evitados, nem pelo governo, nem pelo sindicato. Não tem prazo de validade, nem pode ser punida objetivamente pelo governo. Afinal o professor estará fazendo o seu trabalho, inclusive eticamente falando. Não terá ponto a ser descontado, e o chicote geralmente usado contra os professores, em certa proporção, poderá mudar de mãos. Para onde irá a arrogância de alguns cargos comissionados, que fazem do assédio moral prática comum, quando os que estiverem na base não compactuarem com os ardis que constroem os seus tronos e sustentam os seus cargos? Quem pode perder o emprego se não “bater a meta”? só eles!

Por isso, reitero, a mais poderosa de todas as greves é a não cooperação, é o embargo a fabricação de resultados, porque o governo não tem instrumentos para combatê-la efetivamente. Não tem como combater, porque ela é uma retomada ao exercício efetivo da profissão. Ela não tem prazo para acabar, e não prejudica o aluno, pelo contrário o beneficia, e fortalece nosso vínculo com a comunidade.

Qual diretor poderá ameaçar o professor porque ele está fazendo corretamente o seu trabalho do ponto de vista avaliativo e curricular? Certamente tentarão, mas peçam que eles formalizem a acusação? Vai ser hilário. Não é simples, exige sair da zona de conforto, exige altivez. Mas um grande protesto contínuo pode se dar simplesmente avaliando os alunos conforme a sua situação efetiva, e ensinando o que está estabelecido, considerando a realidade da turma, e não convertendo as aulas em um cursinho preparatório para o SAEPE e Prova Brasil.

E se os administrativos encamparem essa luta? Logo nós (falo como analista) que somos solenemente desprezados pelo governo e pela direção sindical, se não cooperarmos com a transmutação no SIEPE de desistente em transferido, por exemplo? O efeito seria devastador para o governo.  Integração das categorias não ocorre, porque o governo conseguiu fazer-nos crer que nossas lutas competem entre si. Se o embargo for integrado, o tal modelo de gestão vai pelo ralo. O que acontecerá quando os servidores não fizerem nenhum esforço direcionado para bater as inalcançáveis metas? E obter o obscuro 100%, do possivelmente extinto bônus?

Uma reação em cadeia pode retomar os índices do estado ao patamar de anos atrás, sem sabotagem, apenas deixando aparecer o resultado conforme a realidade. (diga-se de passagem cada vez mais difícil). A literatura acerca das reformas educacionais baseadas em responsabilização por resultados, dão conta que a cooperação dos professores é fundamental. O próprio Banco Mundial diz isso.

Ou seja, a linha de montagem passa por nós. Por isso o investimento do governo em bloquear a atuação sindical dos professores das referências, porque sem o tal “alinhamento” eles não alcançam o que desejam. Sem o impulso para melhorar artificialmente os resultados não há o badalado sucesso da reforma educacional de Pernambuco, que engatinhava até 2012, e deu um salto obscuro no IDEB de 2013. (Por falar nisso, seria bom o governo tirar da gaveta o resultado do IDEPE de 2013. Tenho certeza que se fosse vantajoso já teria sido alardeado desde a campanha)

Assim, suponho que, quando associarmos a luta da classe, nas ruas, nas redes e sobretudo no chão da escola, teremos muito mais possibilidades de resistir aos açoites normativos dos governos, bem como, as tentativas de supressão de direitos que tem sido recorrentes. Se tirarmos deles a vitrine eleitoral expressa nos números, estabeleceremos um novo patamar de negociação.

GREVE CONTÍNUA

            A não cooperação é o início do que seria uma greve contínua, caracterizada pelo enfrentamento articulado da política educacional do governo no chão da escola. O enfrentamento articulado configura uma greve contínua, pois, não objetiva combater uma medida pontual, ou obter o melhor possível numa campanha salarial. É resistência interna ao projeto “educativo” do governo, que quanto mais forte se tornar, mais força também terá a categoria de cobrar ações do governo, ao demonstrar o fracasso das suas iniciativas. (A distinção entre não cooperação e o que trato como sendo como greve contínua, foi proposta pelo colega Jairo Girolamo do Grupo Professor PE. Tinha posto aqui que a não cooperação equivalia a uma greve contínua, o que conceitualmente e pragmaticamente não é verdade.)

Continuando como está, cooperando sistematicamente em prol de conquistar a isca do governo (o bônus), acabamos fazendo o jogo (sujo inclusive) dos que nos oprimem, e construindo o trono, de onde são formulados projetos de lei espúrios como o 79/2015. E de onde tem assistido o fracasso sucessivo das tentativas convencionais de resistência, a um jogo que exige outros instrumentos. Quem não lembra da matéria de capa do jornal que estampava em letras garrafais "PROFESSORES DERROTADOS". E a incitação da comunidade contra nós nas matérias dos telejornais. Ou seja, eles estão atualizados na coerção, nós temos sido incipientes na resistência. E portanto “produzimos” grande parte da plataforma política de 2014, conforme o exemplo abaixo:

“A Educação em Pernambuco é destaque nacional. Os números apresentados recentemente no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) mostra a evolução no ensino público no estado. Tivemos um crescimento de 16,1%, superior a todos os estados brasileiros e o que nos fez subir 12 posições no ranking. Sim, Pernambuco está melhor que o próprio Brasil.”




É isto que está em jogo! É uma luta que vai muito além do “round” que está em curso. As circunstâncias clamam por novas perspectivas, tanto de forma quanto de conteúdo da luta sindical na educação. Se é fato que os instrumentos tradicionais de luta ainda têm sua validade, é também verdade, que insistir neles isoladamente, em detrimento das diversas frentes de luta política, é suicídio.

Ribeirão, 06 de Abril de 2015. (revisado em 07/04)
Ítalo Agra

Professor e Analista Educacional
Pedagogo. Mestre em educação.
Membro da administração do Grupo Professor de Pernambuco





[1] Inimputável, no sentido de que o governo não poderá nos imputar a culpa pela greve. Pois, esta é uma greve por dentro. Não responderemos judicialmente pela interrupção do trabalho, porque, estaremos realizando justamente o nosso trabalho. Portanto, nada tem que ver com anomalia psíquica, a que o termo jurídico se refere, pelo contrário, tomo emprestado o sentido parcial desse termo para significar uma ação que reflete a tomada de consciência de classe.
  

quarta-feira, 12 de março de 2014

Inspirado em Bornhausen, Dudu chuta balde ao atacar Dilma | Conversa Afiada

Inspirado em Bornhausen, Dudu chuta balde ao atacar Dilma | Conversa Afiada



“O Brasil não quer mais Dilma”.

“Dilma já está de aviso prévio”.

O autor dos disparos acima é o presidenciável Eduardo Campos, do PSB, que nos últimos dias resolveu mudar de tática e resolveu chutar o balde ao atacar diretamente a presidente Dilma Rousseff, candidata à reeleição.

Há meses empacado nas pesquisas, o candidato da chamada “terceira via”, que vinha fazendo uma dobradinha de oposição light com Aécio Neves, do PSDB, resolveu deixar de lado seu jeitão de nordestino cordato, sempre disposto a aparar arestas políticas com uma boa conversa. No último fim de semana, viajando pelo interior de Pernambuco, Eduardo mostrou a nova face da sua campanha.

Em Nazaré da Mata, o governador pernambucano foi direto ao assunto: “Não dá mais para ter quatro anos de Dilma que o Brasil não aguenta. O Brasil não aguenta e o povo brasileiro sabe disso. É no Brasil inteiro”. Para ele, a adversária que lidera as pesquisas “acha que sabe de tudo, mas não sabe é de nada”.

Eduardo Campos subiu ainda mais o tom ao falar  na manhã desta segunda-feira para um auditório lotado na Associação Comercial de São Paulo, tradicional reduto conservador. “O arranjo políitco de Brasília já deu o que tinha que dar (…). Eu poderia esperar até 2018, mas acho que nosso país não aguenta esperar”.

Bastante aplaudido, o candidato repetiu críticas que os empresários vêm fazendo ao governo: “Para os agentes econômicos fica a impressão de que falta um olhar de longo prazo. Para onde estamos indo, o que vamos fazer?, perguntou, sem dar nem esperar respostas.

Até aqui vendido pelos marqueteiros como candidato da “nova política”, uma opção à velha disputa entre PT e PSDB, Eduardo Campos foi apresentado aos empresários paulistas por ninguém menos do que Jorge Bornhausen, o mais vistoso símbolo do que há de mais reacionário na política brasileira, ex-expoente da Arena, do PDS e do PFL, um cacique que foi ministro de Fernando Collor e tinha muita força no governo de Fernando Henrique Cardoso.

Hoje sem mandato, Bornhausen é agora o mais forte aliado de Eduardo Campos, depois de Marina Silva, que deve ser a sua vice da chapa do PSB. Se Marina já rodou o xale ao saber que Ronaldo Caiado estava na aliança, dá para imaginar como deve ter gostado da chegada do companheiro Bornhausen e da adesão de Roberto Freire, Heráclito Fortes, Inocêncio de Oliveira, etc. Nova política? Assim, o que vai sobrar para Aécio Neves?

O novo estilo belicoso do presidenciável socialista, que rompeu recentemente com o governo do PT, certamente tem muito a ver com a forma Jorge Bornhausen de fazer política. Pelo jeito, a guerra eleitoral já começou.



Clique aqui para ler “Dudu vs Dilma. Deixe o Lula entrar em campo”. 

aqui para ver “Kotscho: Aécio e Dudu empacam na mesmice”.