"Palavra quando acesa, não queima em vão. Deixa beleza posta em seu carvão."(Quinteto Violado) Esse é mais um espaço de veicular minhas ideias e reflexões. Acreditando sempre no poder das palavras e na importância de "dizer-se" como exercício de liberdade, de ser e estar no mundo.
sexta-feira, 29 de abril de 2011
MÚSICA que inspirou o Blog
PALAVRA ACESA (Quinteto Violado)
Composição: Roberto Filizola
Se o que nos consome fosse apenas fome
Cantaria o pão
Como o que sugere a fome
Para quem come
Como o que sugere a fala
Para quem cala
Como que sugere a tinta
Para quem pinta
Como que sugere a cama
Para quem ama
Palavra quando acesa
Não queima em vão
Deixa uma beleza posta em seu carvão
E se não lhe atinge como uma espada
Peço não me condene oh minha amada
Pois as palavras foram pra ti amada
Pra ti amada
Oh! pra ti amada
Palavra quando acesa
Não queima em vão
Deixa uma beleza posta em seu carvão
E se não lhe atinge como uma espada
Peço não me condene oh minha amada
Pois as palavras foram pra ti amada
Pra ti amada
Oh, pra ti amada
Pra ti amada "
Como me dei ao exercício de ACENDER PALAVRAS...
Desde que conheci essa música que a acho linda e extremamente rica de sentido e de atualidade. Desde que aventurei no universo da palavra, inicialmente com a poesia e depois com as crônicas e artigos de opinião que experimentei a vivacidade e o poder das idéias. Sobretudo quando se referem as questões pelas quais se faz silêncio, assim como, pessoas são silenciadas.
Dei um tempo no exercício da palavra, pelo menos nesse exercício artístico e ou político, pois, minha vida acadêmica requer muita dedicação, muita leitura e escrita. Mas a palavra da academia é outra. É delimitada, formatada para que o impulso, a opinião, o sentimento do sujeito seja dissimulado na impessoalidade. E quando eu aparece está desidratado, circunscrito a mera descrição do contexto que origina a pesquisa. É bem verdade que há metodologias e abordagens que compreendem o sujeito e inclusive esta concepção já tem grande fundamentação. Mas, o dizer científico corrente, é o que apresenta o sujeito desidratado mesmo. O que não quer dizer que esteja errado, mas que é ciência.
Há muito tempo exilado no fazer e dizer da ciência, tive um insight a partir dos versos
" PALAVRA QUANDO ACESA, NÃO QUEIMA EM VÃO. DEIXA BELEZA POSTA EM SEU CARVÃO " . Pois, ao sentir saudade da literatura, sobretudo do seu viés engajado, crítico que incomodou algumas pessoas a partir do "Acordes !" (meu primeiro blog). Questionava então se valeria a pena voltar a escrever, e o que escrever. Daí a composição de Roberto filizola me respondeu com esse verso. "Palavra quando acesa não queima em vão", mesmo depois de apagada a chama do momento, o registro da intenção, do sentimento, a manifestação estética e política fica resgistrada. Para alguém vai ser mais que mera mensagem. Para alguém fará sentido ,a força da palavra ACESA pelo sentimento sincero, pela pulsação vital que me impele a dizer-ME.
Portanto, encontrarão aqui textos, versos e imagens despretensiosos quanto a um fim específico, datado. Não tenho mais a pretensão de " Acordar " ninguém como no exclamativo e polêmico Blog anterior. A partir de então apenas me produzir palavra acesa para olhos atentos. Pois , a sabedoria do mestre dos mestres deixou o legado que agora sigo, quando dizia " quem tem ouvidos ouça", e hoje 2.010 anos depois de sua morte tantos ainda não o entenderam, quem sou para ter a pretensão de produzir luz para ser vista e aceita por todos.
No mais, a música do Quinteto diz tudo o que mais sustém a luminosidade literária que agora me impulsiona. Aproveitem e escutem essa preciosidade desse grande grupo musical
pernambucano.
Saudações Gameleirenses
Ítalo @gra
Áudio da música
http://www.youtube.com/watch?v=ohF9uZ3TvMM&feature=related
Portal do Quinteto Violado
http://www.quintetoviolado.com.br/
PALAVRAS E SILÊNCIOS
Ouvir o silêncio é um exercício salutar a todos que sofrem de verborragia, ou seja, uma “hemorragia” de verbo que pode ser resumida na expressão popular que “quem muito fala pouco ouve “. Por outro lado reservar-se a um silêncio sepulcral nos “eleva” a condição seres inanimados.
Isto, pois, foi muito bem dito pelo gênio da poesia e nosso irmão de além-mar Fernando Pessoa. Para ele “Mover-se é viver, dizer-se é sobreviver”, acho fantástica essa expressão, pois, diferencia o viver biológico do viver existencial. Ou seja, o homem animal racional do homem sujeito, que intervém no seu mundo, que produz cultura. Com o mesmo raciocínio podemos diferir o falar do dizer.
Falar é inerente a condição humana, é um recurso comunicativo de seres dotados de linguagem racional e que inclusive pode ser aprendida vivendo, sem precisar de escola ou preceptores. Dizer-se é diferente, pois, implica em auto-conhecimento, identidade e por conseguinte a afirmação do ser, como defesa de suas opiniões, projetos, sonhos e/ou ideologias. Portanto, quem coloca seus pulsos vitais no que escreve e no que diz consegue dizer-se, estender sua condição de sujeito, ter voz ativa, já que falar por si só não representa nada de original.
Porém, para que as palavras adquiram o pulso vital de quem às escreve ou proclama os silêncios são fundamentais para sua construção. Daí que o excesso de palavra ou de fala vira verborragia. Há um caminho árduo que precede o dizer-se que é o da reflexão sobre si e sobre a realidade objetiva que o circunda. Ser, portanto, um sujeito autêntico nesse tempo de ideias pasteurizadas, em que a homogeneidade vira elo de valor e a Inteligência binária o parâmetro para pensar o mundo, entre sim e não, comprar esse ou aquele, falar ou ficar calado.
Nesse tempo pós-moderno caracterizado pela homogeneização cultural as criações tendem a ser mais do mesmo. Nesse contexto entender as nuances entre palavras e silêncios, entre falar e dizer-se, entre ser sujeito ou objeto, politizado ou apolítico vai ficando cada vez mais difícil. Sobretudo se trilharmos nos caminhos do sim ou não, perderemos muito do há de complexidade entre ser ou não ser.
Esta aí a diferença dos clássicos como Fernando Pessoa e outros versos triviais que enchem prateleiras de livros não vendidos. Está aí a diferença abissal entre a música de Cartola e dos pagodinhos descartáveis, de Chico Buarque e o bonde do tigrão e as mulheres frutas que lhes sucederam, de Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro e os forrós enlatados que tem que dizer o nome da banda no meio das músicas para serem reconhecidos, tamanha mesmice que alcançaram.
Os que construíram músicas, livros, ideias e sons que transcenderam o seu tempo nos deixam o legado humano do “Dizer-se” que pode ser imensamente impulsionado com os nossos recursos pós-modernos. Afinal, não existe mal absoluto e a história existe como possibilidade. Vejamos o grande fenômeno das redes sociais na internet que tem quebrado o monopólio das grandes mídias, vede o fenômeno da blogosfera, as listas , as correntes os sites de compartilhamento tem aberto grande possibilidade de difusão de ideias e artefatos culturais que antes ficavam circunscritos a um grupo tão restrito.
É bem verdade que a produção e difusão de informações falsas e inúteis é extremamente superior ao bom conteúdo, mas, o que seria o “ruim” sem o “bom” para fazer seu contraponto. Reconhecer esse lixo todo, já é algo muito importante de ser refletido nas escolas e nas redes sociais. O que me enche de esperança é a possibilidade de dizer-se do sujeito da favela que foi o porta-voz da população durante a invasão do complexo do alemão. Enquanto a grande mídia não tinha muito mais que palavras vãs e o silêncio da dúvida, surge da comunidade uma expressão autêntica que certamente seria invisibilizada nas matérias convencionais onde são postos implicitamente como um mal a ser controlado, como uma sujeira para ser varrida para debaixo do tapete.
Portanto, cá estou eu, nesse espaço virtual que se torna um outdoor da minha experiência no mundo. Cá estou eu, sujeito comum do interior pernambucano, provavelmente invisível aos grandes meios posso dizer-me sem pedir licença nem fazer alarde. Posso exercitar o direito de ter voz , e seguir vivendo entre palavras e silêncios como tensões necessárias para produção de qualquer reflexão fértil sobre nossa realidade objetiva. Pois, não adianta dizer por dizer, de palavra morta bastam as nossas leis.
Sobretudo, nesse interior que vivo, mata sul pernambucana, em que o silêncio foi plantado como o cultivo da cana no qual a riqueza natural e a diversidade vai sendo pilhada por mais do mesmo, pela plantação de um deserto verde até quando a terra suportar. O ser humano por aqui é tratado como a cana, o que ele possui de riqueza lhe é subtraído até que reste quase nada, um pouco menos que bagaço. Dizer-se nessas condições é bem difícil.
Nossa passividade tem raiz, pois nossas gerações passadas foram cultivadas com suor e sangue. De forma que silenciar passou a ser a ordem natural das coisas. Não é o silêncio que falei inicialmente, que implica em reflexão que precede o dizer-se. Esse silêncio é um sintoma da morte do sujeito, da pessoa que foi posta na condição de coisa e como tal não há o que dizer. Se não há o que fazer e as coisas são assim mesmo, a vida se resume a viver o agora, a dançar a dança e tentar sobreviver enquanto der.
Dizer-se por aqui é sintoma de vida, assim como o silêncio sepulcral é efeito de morte da condição do sujeito. Uns silenciados por acharem natural ser assim e outros silenciados pelas leis da sobrevivência a que estão expostos, quando suas ideias arriscam seu pão, seu sustento a condição de sujeito tem que ficar em segundo plano. Infelizmente, por aqui democracia é uma ordem figurativa que enfeita nossa legislação, mas, que pouco chega a mudar a condição de negação da cidadania a que tantos estão expostos.
Para mim, que vivi a condição de silenciado a contragosto, Dizer-me é mais que o exercício da minha alforria é um dever que me atribui, de seguir uma luta inglória de fazer o contraponto que é tão necessário ao progresso da humanidade. Conheço o silêncio, a palavra e a falta que eles fazem e o mal que produzem em seus excessos. Sobretudo em nossa região em que o silêncio ganhou status de lei natural. Dizer-me é uma forma de fazer justiça aos que até agora não “podem”, aos que morreram sem poder e manter acesa a chama de que algo diferente existe, de que podemos assumir uma posição ativa e intervir na condução da nossa história.
Celebremos então a história como possibilidade.
Ítalo Agra
Ribeirão – PE, 26/04/2011
[i] PESSOA, Fernando. Livro do Desassossego: composto por Bernardo Soares, ajudante de guarda-livros na cidade de Lisboa. – São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
Link do livro em PDF http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/vo000008.pdf
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